A descoberta desta arte foi no Museu de Rendas de Bilros de Peniche.
Ver dúzias de bilros pendurados numa almofada com os fios que contornam alfinetes e seguem os desenhos em papel de cartão já causou alguma perplexidade perante a aparente complexidade da tarefa.
Mas, maior foi a admiração ao ver a senhora Natilde, (com N) a fazer a renda em movimento de mãos acelerado e a cruzar os fios com os bilros. Quando me disse a idade ainda fiquei mais espantado. Começou a aprender aos seis anos e agora tem 97.
Aprendeu com umas senhoras mais velhas e quando regressava da escola primária fazia algumas rendas em casa. Começou a gostar e mais tarde fazia para venda, “Fazia a vida de casa” e depois ocupava-se com as rendas. Ainda continua a fazer “embora já tenha a vista cansada” e não pode fazer muito.
Conforme ia falando comigo Natilde continuava a cruzar os fios e seguia com atenção o desenho. Tudo com grande perícia embora me diga que agora já não faz tão depressa. “Tenho feitos umas encomendazinhas quando me pedem. Fiz para as filhas e para as netas. Agora faço renda devagarinho, já não faço serões.”
No passado fazia uma grande variedade de rendas. Há as mais elaboradas e as mais populares com pontos repetidos. As encomendas ditavam rendas para várias funções – “fazíamos várias peças. Jogos para os quartos e para os móveis, toalhas de mesa, decoração de toalhas e lençóis…” Em modo de desabafo, Natilde acrescenta que “é um trabalho que demora muito a fazer. A gente não ganha dinheiro à hora. É à peça e cada uma leva muito trabalho. É mal pago mas há quem pense que é caro. De qualquer forma, quem compra leva uma coisa bonita e que dura para toda a vida”.
Por ser um trabalho moroso e com pouco rendimento a prática da renda de bilros em Peniche entrou em declínio. Era um contributo para o orçamento familiar e ganhou maior dinâmica no século XIX com a produção em oito oficinas.
O fim do curso de Rendeiras na Escola Industrial em 1956 também ajudou a esbater a tradição que foi, entretanto, reavivada com o município a criar a Escola de Rendas de Bilros.
Nesta semana faz três anos que foi inaugurado o Museu da Renda de Bilros de Peniche.
A senhora Natilde diz que há muita gente a aprender. Não para actividade profissional mas porque gostam. Algumas pessoas já estão reformadas. Há também quem tenha grande força de vontade como por exemplo uma senhora de Lisboa que se deslocava todos os dias a Peniche para aprender. “E aprendeu bem. O importante é saber evitar o erro porque tudo tem de ficar certinho”. A maioria das pessoas aprendem para depois oferecerem peças à família.
O Museu tem em exposição rendas antigas, os materiais e instrumentos que são utilizados e também conta a história da tradição das rendas em Peniche. Em alguns dias pode-se ver uma rendeira a trabalhar. Sem dúvida que é a melhor oportunidade para ver a arte e a perícia das rendeiras de Peniche.
A perícia de Natilde a fazer renda de bilros faz parte do programa da Antena1, Vou Ali e Já Venho, e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.
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