Para se usufruir devidamente uma viagem na Bolívia, tem de se ser calmo, paciente e ter uma disponibilidade especial para o imprevisto.
O olhar tem de ser local e a curiosidade, essa sim, pode ser mais pessoal.
Entrei na Bolívia pelo lado peruano do Titicaca.
O autocarro de Puno para Copacabana partiu às 7.30h. Tem de se estar na paragem meia hora antes. Para deixar bagagem e verificarem o passaporte.
A viagem foi na Titicaca Tours e custou 20 soles. Um operador dirigido a turistas.
O autocarro não era mau. Em baixo tinha lugares cama. Em cima, assentos confortáveis.
Muitos jovens mochileiros e dois casais na casa dos 60 anos.
Sei a idade porque tem de se preencher uma ficha à entrada do autocarro.
A viagem é quase sempre ao longo do lago Titicaca.
Paisagem rural, estepe, llamas (ou guanacos), vacas e muitos cães a vadiarem nas ruas.
A passagem na fronteira é muito peculiar.
O ajudante de motorista diz que ali ao lado, na loja de câmbios, é onde existe a melhor taxa e que, na do lado boliviano, é maior o risco de moeda falsa.
Troquei 100 euros e levaram uma taxa de cerca de 10%.
O passo seguinte foi meio confuso. Os passageiros sairam do autocarro e muitos seguiram os outros porque não havia sinalética.
Ainda do lado peruano, entrava-se num edifício, viam o passaporte e o papel de entrada e mandavam-nos para outro escritório. Neste, carimbavam o papel e tínhamos de regressar ao lugar inicial, onde carimbavam o passaporte.
Depois seguia-se para o lado boliviano.
Uma estrada, ligeiramente a subir, ocupada nas bermas por vendedores ambulantes e pequenas casas de venda de artesanato e câmbio.
Umas escadas davam acesso à imigração. Não fizeram perguntas. Carimbaram e mandaram seguir.
Após esta rotina, os turistas ficaram na rua, no caso à chuva, sem saber o que fazer.
O autocarro ficou para trás e com as portas fechadas.
Só muito tempo depois é que avançou e aguardou pelos passageiros.
Copacabana fica a 9 km da fronteira.
O local de chegada foi uma praça que dava acesso a uma rua cheia de autocarros, com muita gente a oferecer bilhetes para os mais variados destinos.
Próximo do escritório da Titicaca Tours. Rapidamente se percebe que é a rua principal.
Igual à imagem que aparece em todo o lado: uma descida em direção ao lago, com casas destinadas aos tempos livres dos turistas.
O hotel Utama fica numa rampa, numa rua lateral. Chegar lá foi um sufoco.
Na receção disseram que tinham uma carrinha com um letreiro na paragem dos autocarros. Podiam ter avisado antes!
Mais tarde, vi uma turista japonesa que demorou uns 10 minutos a subir a rampa. Eu próprio a ajudei e percebi a dificuldade. A mala era pesada, muito pesada. Além do sufoco da altitude!
Fiquei no segundo andar do Utama. Um quarto mediano e com vista para a cidade.
A subida pelas escadas internas é que não era convidativa.
A tarefa seguinte foi descer ao lago e visitar a lha do Sol.
A ilha é um dos pontos turísticos da região do Titicaca. É a maior ilha do lago e era um lugar sagrado para os incas.
O barco partiu às 13.30h. É a única hipótese de conseguir ida e volta no mesmo dia.
Tinha de estar 15 minutos antes e o almoço teve de ser rápido. Um hamburger de frango e verduras num restaurante/bar à beira do lago.
A viagem de barco demorou quase hora e meia.
Muitos turistas e poucos locais.
Na parte de cima, vento e sol. O homem do leme falava com um passageiro e ao mesmo tempo protegia uma menina que, entretanto, adormeceu. Com a perna esticada orientava o leme.
A chegada à parte norte da ilha tem uma surpresa; uma escadaria de pedra de algumas dezenas de metros.
Os que levavam mochila tinham de fazer pausas. Os que transportavam mais peso, quase morriam de cansaço.
No cais e no início da escadaria surgiram crianças a oferecer alojamento.
Há quem fique na ilha e partilhe o dia a dia com uma família. São essencialmente casais jovens.
Após várias paragens, consegui subir a escadaria. A parte seguinte foi um caminho onde uma criança posava para as fotografias com um llama. Ela irritava o animal, este reagia e os turistas sorriam ou tiravam fotos.
Depois, com algum receio, acariciavam o llama. Nova foto.
A etapa seguinte do caminho era uma rua com barraquinhas de artesanato.
Fiquei dececionado. A ilha do Sol é, afinal, um postal ilustrado para turista ver.
E só tinha uma hora (mais tarde fiquei a saber que esta é uma ideia falsa: tem é de se entrar pelo lado sul e percorrer a ilha. A área é superior a 14 km2).
Decidi regressar ao porto. Preferi o ambiente local.
Crianças a vaguear, mulheres a vender água e artesanato aos turistas, e gentes locais a trabalhar no cais.
Algumas pessoas da ilha olham para as águas do lago num gesto contemplativo.
A calma é repentinamente quebrada por uma turista, desesperada, a correr em direção ao barco que entretanto tinha partido. Da ponta do cais a turista suplicava. O condutor do barco, ao fim de um “eterno” momento, acabou por aceder aos apelos e regressou.
Outras embarcações iam chegando. Algumas com mais turistas. Outras com sacos. Mantimentos para os locais e para venda aos visitantes.
Grupos de mulheres recolhiam os sacos da embarcação e transportavam-nos para o cais.
A subida era feita com burros.
A nossa viagem de regresso foi um pouco cansativa. Entrava muito fumo e o barco fez duas paragens.
Já em Copacabana, fez-me adeus a jovem (estrangeira) que me tinha servido o almoço. Disse-me que nunca tinha ido à ilha do Sol. Andava por ali e ainda não tinha satisfeito a pouca curiosidade de visitar o local mais turístico daquela região.
Há um número considerável de jovens estrangeiros que vão para Copacabana procurando imitar o ambiente de Goa. Convivem com os locais, fazem malha e prestam intermediação com os turistas.
Aparentam ser felizes e despreocupados.
Um quadro mais agradável do que o regresso ao Utama. A subida mata qualquer um…
O final da tarde foi de novo junto ao lago e o anoitecer passado na rua turística, com vista para o Titicaca.
O jantar foi num restaurante, frequentado por um misto de turista de classe média com jovens locais, que entram e saem com bebidas e algo mais.
A etapa seguinte, a partir de Copacabana, era fazer a viagem, num só dia, até Uyuni.
Para o conseguir tinha de ir autocarro até La Paz e depois seguir de avião (já tinha comprado o bilhete).
Um percurso longo. Tive de apanhar o autocarro das 7h em Copacabana.
No Utama disseram-me que havia vários e recomendaram-me três companhias rodoviárias. Garantiram que não havia qualquer problema em partilhar o autocarro com locais. Tinham razão. Melhor: foi uma boa sugestão.
A noite foi agitada. Uma trovoada, mesmo em cima de Copacabana.
Os trovões, de tão intensos e frequentes, nem deixavam ouvir o barulho da chuva.
Saí muito cedo.
As luzes do hotel ainda estavam apagadas e descobri mais uma qualidade do Iphone.
O homem do hotel dizia que era muito cedo. Pouco depois, acrescentava que estava na altura certa de ir embora (ou ele é que ainda achava que podia dormir mais um pouco).
Faltavam alguns minutos para as 6.30h, a meia luz, lá fui sozinho pelas ruas de uma vila boliviana. O contrário de todas as recomendações de segurança!
Na praça dos autocarros começavam a chegar os vendedores ambulantes com as suas barraquinhas, alguns cães dormiam enrolados e um autocarro recebia passageiros.
O silêncio da manhã era interrompido por um angariador de clientes que gritava La Paz, La Paz.
Do outro lado da rua, os homens das vans gritavam Tiquina, Tiquina.
Aguardei algum tempo, quase meia hora, para ver se os escritórios das companhias de transporte abriam. Nada, tudo continuava fechado. Acabei por ir falar com o angariador do único autocarro para La Paz.
Quando entrei já havia um grupo de jovens franceses. Ao longo da viagem revelaram alguns comportamentos característicos de certo tipo de turistas.
Ocuparam os lugares, sem respeitarem os bilhetes, e se alguém aparecia para ocupar o respetivo assento, assumiam um ar ingénuo e ignorante.
Pior de tudo, expressavam sempre um ar superior e de repulsa em relação aos bolivianos. Jovens de idade e centenários no posicionamento e assimilação cultural.
Pouco a pouco o autocarro foi enchendo. Na fila atrás, ficou outra turista. Jovem. Parecia constipada mas passou quase metade da viagem a cantar em voz alta, o que irritava os franceses.
Já com o motor a trabalhar, entrou um casal de idosos. A mulher ficou ao lado da turista cantaroleira dos Beatles. O homem foi o meu vizinho de viagem. Parecia que estava com frio e repetidamente forçava o fecho das janelas para evitar qualquer aragem.
Minutos depois, começou a contar moedas e, mais tarde, algumas notas de 10 bolivianos, que tinha dobradas.
De vez em quando falava sozinho. Gesticulava ao mesmo tempo. Como quem diz: isto é assim e assim. Ponto final. Mais tarde fazia um outro gesto que se podia traduzir em Está decidido.
Quase sempre muito concentrado, ia vasculhando o nariz e quando pescava alguma coisa largava a presa no assento do lado da janela.
Com a mulher foi trocando algumas palavras e, depois, um saco. Tinha pão e tirou um naco.
Pelas ruas de Copacabana ainda foi entrando mais gente.
Mesma na estrada, que serpenteia os Andes, surgiam de nenhures alguns casais.
Elas sempre com trajes tradicionais, meias grossas, sapatos bicudos e longas tranças.
Quando chegámos ao cais de Tiquina tivemos de sair.
Uma jovem turista ficou muito preocupada. Ela queria saber o que se passava. O motorista falou com um militar e a resposta foi peremptória: é proibido atravessar o canal dentro do autocarro.
A travessia para os passageiros era feita numa pequena embarcação. Custou 2 bs.
A travessia foi partilhada com bolivianos.
A vista da travessia é bonita e a passagem é rápida. Do outro lado, instalações militares. A Bolívia estava muito militarizada, em todo o lado.
Retomámos a viagem e depois de muitos kms a ver o Titicaca, entrámos na estrada principal. Liga Desaguadero a La Paz.
Um furo.
Mais meia hora de paragem.
Homens e mulheres, bolivianos, saíram do autocarro e, com grande curiosidade e alguns comentários, assistiram à mudança do pneu.
Pouco depois das 10h surgiram os primeiros sinais de uma zona urbana.
Confusa, sem arruamentos.
Vendedores de tijolos, sementes, bate-chapas… e tendinhas de comida.
Era El Alto, uma das maiores cidades da Bolívia que fica nos subúrbios de La Paz.
Centenas de prédios de dois a três andares despidos de tinta. Só a cor de tijolo.
Nas ruas andavam centenas de pessoas. Com aspecto rural. Contornavam as tendas, serpenteavam pelo meio dos carros e valas, quando se dirigiam para as casas.
O trânsito começou a ficar caótico.
Em boa verdade, em alguns locais não se percebia bem onde era a rua.
Tudo servia para seguir em frente, para os lados e em sentido contrário. Um formigueiro de gente carregada de sacos, as mulheres de roupa colorida e alguns homens sobressaíam com os fatos gastos, às riscas verticais.
Em El Alto, antes de entrar no cento de La Paz, saí do autocarro.
O motorista disse aeroporto e segui a sua sugestão. Erro.
Valia mais ter ido até à última paragem. Demorava mais tempo mas era mais seguro.
Onde saí, é-se despejado no meio do caos.
A sorte foi um boliviano, que me orientou e até acompanhou parte do percurso numa van.
Antes de nos separarmos teve o cuidado de me levar a uma mulher polícia para perguntar onde era a paragem das van para o aeroporto. Ela respondeu é já ali e vem lá um.
Consegui atravessar o cruzamento, no meio do trânsito caótico, e num instante a van levou-me ao aeroporto.
As instalações eram pequenas, estavam em obras e com cartazes de Evo Morales.
A foto do presidente era uma constante em toda a Bolívia.
Mais triste, foi a senhora que almoçou no restaurante do aeroporto. Estava sozinha, aparentemente calma, mas chorava, chorava….
A viagem de avião na Amaszonas até Uyuni demorou cerca de 50minutos.
A segunda passagem por La Paz foi no regresso de Uyuni.
Chegada ao aeroporto em El Alto e correria de táxi para a zona do cemitério. Custou 60 bs. Foi caro mas não deu para regatear.
De novo a visão de uma cidade de tijolo. Milhares de casas com tijolos à vista.
La Paz tem um formato de concha.
A zona do cemitério não era muito diferente de El Alto.
O teleférico atravessa toda a cidade. Deve ser deslumbrante para fotos.
Vários guias dizem que La Paz é uma cidade desinteressante, não tem uma âncora, um motivo forte para ser visitada.
Decidi não ficar.
Ouvi vários turistas fazer a mesma pergunta: vale a pena visitar a cidade?
Depois do que vi, acho que fiz mal em não ter ficado pelo menos uma noite.
Chegado ao cemitério, o taxista deixou-me no meio de um emaranhado de vans e vendedores de bilhetes.
Muito barulho e muita gente.
Inóspito para um estranho.
Encontrei um autocarro que partia às 9h para Copacabana.
O lugar era à frente, ao lado de um boliviano.
Com as duas mochilas e porque queria tirar fotos, fui para os últimos lugares que estavam praticamente vazios.
Fizemos depois uma paragem de vários minutos no El Alto.
Angariadores procuravam mais clientes. No meio da rua.
No passeio várias mulheres vendiam alimentos, gelados, roupas e frutas. Tudo num frenesim.
Entraram vários passageiros.
Uma jovem mãe veio para o lugar onde eu estava. Acho que eu estava a ocupar o lugar dela. Disse-me para continuar no mesmo sítio que ela sentava-se ao lado.
A criança ainda não sabia falar. Antes de entrarem no autocarro, na despedida, o pai comprou-lhe um saco com um líquido. Não serviu de grande coisa. A criança não tinha grande vontade. Quem o bebeu foi a mãe.
Dei-lhe duas bolachas mas, quem também as comeu foi a mãe. Mais tarde dei-lhe o resto da embalagem.
Ela não devia ter mais de 18 anos. Muito jovem e com ar muito doce. Tratava a criança com voz baixa, calma e um sorriso permamente. Depois, ficava a olhar para o infinito. A sua mente não estava ali.
O tipo de roupa que usava e o tom da pele evidenciava que devia ser andina..
Quando da travessia em Tiquina ela não saiu do autocarro e nunca mais a vi.
Comprei smarties para a criança mas quem acabou por comer um saco fui eu. A outra embalagem foi para um dos filhos do Jorge, o dono do Mirador del Titicaca.
A paragem em Tiquina demorou alguns minutos. À espera do autocarro.
O trânsito estava intenso. A praça central cheia de gente. Alguns com fato domingueiro.
Muitos locais e poucos turistas. Gente a passear, outros a vender souvenirs e fruta.
Comprei um cacho de bananas para matar a fome. A senhora, de idade, ainda me ofereceu mais uma. Eram enormes e castanhas.
No meio da praça, a sombra do coreto era muito procurada. Atrás, vários rapazes jogavam matraquilhos.
Daqui via-se uma rua apinhada de gente.
Os mais idosos refugiavam-se nas sombras das pequenas casas.
Na primeira parte da viagem de autocarro o condutor acelerava bem. Não havia muito movimento porque era domingo.
Estava sol e algumas mulheres lavavam roupa. Estendiam-na em cima de plantas, o que formava um mosaico colorido.
Muitas famílias trabalhavam na agricultura, apenas com a ajuda de animais. Agricultura não mecanizada, grupos de pessoas que arrancavam batatas, outras que faziam montes com cereais e crianças que ajudavam os pais ou ficavam a guardar o gado. Em algumas povoações, viam-se muitas mulheres junto de crianças, à porta de casa.
Como era domingo, havia também famílias que se juntavam, formavam um círculo e conversavam, no campo ou à beira de casa. Algumas estavam deitadas, outras sentadas.
Ainda no lado da Bolívia, em algumas localidades, reuniam-se os membros das comunidades locais. Numa delas, jovens músicos de uma orquestra desfilavam pela rua.
Do lado peruano havia a azáfama da agricultura, trabalhos caseiros como a lavagem da roupa. Mas nada mais.
É curioso que a fronteira marca também outras diferenças, essencialmente na construção das casas.
Do lado boliviano há mais habitações arranjadas e pintadas e os tijolos são predominantemente cinzentos.
Do lado peruano, pouco depois da fronteira, há casas mais coloridas e as habitações são mais dispersas. Espalham-se pelos vales.
Conforme nos aproximamos de Puno, voltam a cor dos tijolos e a concentração desordenada, sem arruamentos. Segundo o David, o taxista que andou comigo em Puno, as pessoas não têm dinheiro para pintar as casas e acabam por deixar os tijolos à vista.
Outra particularidade das casas mais recentes é que têm vidros espelhados. Provocam um efeito estranho. O avermelhado dos tijolos, cores monótonas, que são quebradas pelos reflexos intensos nos vidros.
A estrutura de muitas habitações era um piso térreo e em cima módulos quadrados. Conforme a família cresce ou há mais dinheiro, a casa também vai aumentando.
São poucas as habitações com mais de dois pisos. Mais nas cidades.
Parte significativa da viagem é andar à volta do Titicaca.
Do lado boliviano, o lago tem menos algas. Aqui e ali há um pequeno porto com embarcações de recreio.
Pontualmente encontram-se também pequenos viveiros de peixes. A truta é um deles e é cozinhada de várias formas. Em Copacabana comi cozinhada no forno, em Puno era frita. Também fazem a vapor.
O lago dá uma forte ajuda à pecuária. Muitos terrenos servem de pasto para vacas, ovelhas e llamas.
Tudo serve para alimentar os animais. Até a erva situada na beira das estradas.
Mesmo as encostas íngremes das montanhas, com declives muito acentuados, é local de pasto para vacas. Nem percebo como não caem.
Também é usual ver burros e cavalos. Cães há por todo o lado. Ao abandono ou com coleira atrás dos donos.
Pouco depois de se passar por Copacabana, o horizonte é dominado pelos Andes.
Serras com escarpas. A estrada corta as montanhas.
Depois, quando nos aproximamos de Puno, regressam os vales. Com plantações misturadas com casas, pequenas cabanas e animais espalhados por todo o lado.
A estrada é alcatroada. Tem apenas duas pistas. Porém, tem de se pagar portagem.
O taxista de Puno, o David, disse-me que é a Carretera Panamericana. Estava enganado (o David também não conhecia o Cristiano Ronaldo).
A Panamericana percorre quase toda a América do Sul sempre pela costa, ao lado do mar.
Algumas vias estão a ser construídas e, noutros casos, são visíveis algumas infra-estruturas recentes.
Nos dois países, o marketing governamental aproveitava estas oportunidades para mostrar a obra feita.
Do lado peruano havia também uma forte presença da comunicação municipal. Em Puno o lema era: Um governo sério e ativo.
Do lado boliviano a situação era bem diferente.
Quase toda a comunicação estava centrada em Evo Morales. Frequentemente com a fotografia do Presidente boliviano.
Desde a passagem do Dakar a pequenas obras de construção civil.
Para E., o guia no salar de Uyuni, Evo Morales é um bom Presidente. Tem feito muitas mudanças e uma das preocupações é salvaguardar a Bolívia de interesses estrangeiros, que procuram apenas explorar os recursos naturais e os meios humanos.
No lado peruano, a comunicação política era mais competitiva e visível.
Devido à organização do sistema político, há candidatos para os mais diversos lugares: municipais, governadores, presidentes.
A forma mais usual de propagandear o nome dos candidatos era em murais.
Em poucos quilómetros, à beira da estrada, encontravam-se dezenas de nomes pintados nas paredes das casas e nos muros. Quando se mudava de município, surgiam novos nomes.
A mensagem estava muito centrada nos valores éticos e na eficácia da ação.
Do lado boliviano acrescem as referências nacionalistas.
Estas inscrições quebram muitas vezes o domínio do castanho avermelhado dos tijolos.
No Peru é também frequente encontrar murais alusivos à plantação de coca.
A viagem entre La Paz e Puno foi feita em duas companhias de transporte.
Entre La Paz e Copacabana utilizei um autocarro vulgar, com transporte de locais. Talvez seguissem na viagem apenas quatro turistas. Silenciosos, queriam passar despercebidos. Também não eram o centro da atenção dos companheiros de viagem. Se queriam saber alguma coisa, tinham de perguntar.
O preço do bilhete era muito barato e não tinha extras.
A viagem entre Copacabana e Puno foi diferente. Um autocarro para turistas da Titicaca Tours.
Sai de Copacabana às 13,30h. No piso de baixo, bancos cama. Em cima, bancos normais, com encosto para as costas e para as pernas. O autocarro estava lotado e seguia para Cusco.
Muitos jovens e muitas conversas cruzadas. Brasileiros, colombianos, europeus, israelitas… a arca de Noé dos mochileiros.
Alguns passageiros vinham do Chile, atravessavam a Bolívia e seguiam para o Peru.
Nas paragens mais relevantes aparecia um funcionário da Titicaca Tours que dava orientações aos turistas sobre os procedimentos a tomar. Nos locais onde ficavam passageiros também aproveitava a oportunidade para servir de angariador para tours ou alojamentos.
Muitos decidiram ficar em Puno para visitarem a ilha de Uros.
Regressei à base.
Ao Mirador del Titikaka onde, com a ajuda do Jorge, reorganizei a viagem, designadamente o regresso a Lima com um voo da Lan a partir de Juliaca.
No hotel estava um casal de portugueses, um mexicano e o casal suíço que tinha visitado a ilha do Sol. Gostaram da visita e explicaram-me que estiveram mais horas, fizeram o tour pelo lado sul e a escadaria, que quase me matou de cansaço, eles fizeram a descer.
Uma diferença que pode mudar a opinião sobre o passeio.
Quanto a Copacabana partilharam o ponto de vista: feia, nada de mais. Uma rua e acabou.
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