No Mercado do Livramento em Setúbal o comércio é erudito e diverso.
Espontâneo no linguajar dos vendedores e suave no traço dos milhares de mosaicos que contam a vida de Setúbal.
Não é uma estratégia de marketing que procura uma história e tradição para contar. Não. A história é genuína como as pessoas que todos os dias dão vida ao mercado. “Este mercado, desde a sua origem, em 1875, até ao presente manteve a sua identidade. Por isso, é que não há alterações significativas.
Adaptou-se às exigências dos tempos modernos, por exemplo na segurança alimentar, mas a sua essência, a sua identidade, manteve até aos dias de hoje”. A narração é de Henrique João que trabalha no mercado há quase 60 anos. Como ele diz, praticamente desde que nasceu, e traça de um modo claro as marcas identitárias: a qualidade, a diversidade e a tradição.
Falei com Henrique João ao lado da sua banca de peixe, próximo de uma enorme cabeça de um espadarte que dificilmente cabia no ângulo das lentes fotográficas dos turistas.
Alguns pensariam que estavam em alto mar porque ondulavam em redor da extremidade afiada do peixe, quase em cima da banca. Mas, Henrique João não dava sinais de incómodo porque os turistas fazem parte de um novo tipo de cliente, “a clientela é como em qualquer outro estabelecimento. Há pontos altos e baixos. No entanto, a clientela não estagnou. Pelo contrário, cada vez vai-se renovando mais.”
O mercado tem cerca de 300 concessionários. Somando os empregados são cerca de 900 pessoas que todos os dias trazem para as bancas testemunhos frescos da riqueza do mar e da terra.
O mercado foi construído fundamentalmente para os sectores da pesca e da agricultura. Precisa Henrique João que a finalidade era para “os produtores agrícolas da região de Setúbal e Palmela virem aqui vender.
O que hoje ainda sucede. Com o peixe é a mesma coisa. Embora, no processo de renovação pode entrar um ou outro que não tem identificação com o mar ou com o rio. Mas, na generalidade, quem cá está a vender peixe tem a ver com Setúbal, com o rio, com a nossa identidade setubalense.”.
E com o Vitória porque é notória a quantidade de bandeiras penduradas nas bancas.
As pescas e a agricultura estão também retratadas em estátuas de Augusto Cid. São peixeiras, vendedoras e flores de ovos e muitas outras figuras com dimensão humana. O seu silêncio nota-se em particular nos corredores junto às bancas do peixe.
Aqui a azáfama parece contagiada pela fúria do mar ou pelas marés do rio. Os agricultores são mais pacientes. Aguardam calmamente os clientes enquanto arrumam melhor os vegetais ou acrescentam beleza às flores.
O espaço é amplo e todas as bancas estão no piso térreo. Circula-se com facilidade.
O Mercado do Livramento vai fazer 145 anos. Foi reconstruído em 1930, com colunas de ferro e tem muita luz natural. Desta reconstrução remonta uma outra marca do Livramento: o painel com 5.700 azulejos que, de certa forma, estampam num instante a vida da cidade.
Fernando Augusto tem a banca mesmo ao lado da parede onde é contada a salga do peixe, a reparação de redes, a descarga da sardinha ou a vindima e a apanha da azeitona e também segue com atenção o comportamento dos visitantes, “começam a filmar de uma ponta à outra”.
As histórias da rotina de Setúbal há um século atrás foram restauradas há menos de uma década devido a queda da parede onde se encontrava o painel.
Mais colorido e também com um historial menos agitado são os painéis colocados nas duas portas da Avenida Luisa Todi. São também retratos da cidade e da sua relação com o rio Sado.
O Mercado do Livramento está no coração da cidade, tem pormenores de Arte Nova e a vida das várias comunidades que convivem harmoniosamente e num ambiente de grande diversidade.
Aqui encontra informação pormenorizada sobre o Mercado do Livramento.
Mercado do Livramento: “qualidade, diversidade e tradição” faz parte do programa da Antena1, Vou Ali e Já Venho, e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.
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