Estamos numa plataforma de madeira e vidro. Suspensos sobre uma encosta de granito e o rio Douro que passa no fundo do vale. Suspensos fisicamente e com a respiração suspensa pela força da Natureza.
O Douro corre apertado, sereno, depois de ter deixado para trás a barragem de Picote. Reflete cores intensas da luz do sol, reflexos de nuvens ou sombras escuras, silhuetas em movimento das enormes encostas ingremes e rochosas.
Depois de uma longa passagem pelo vale que o nosso olhar tem dificuldade em perceber a extensão, por ser muito estreito, o rio Douro faz uma curva apertada, mas não se alarga muito porque uma frente rochosa teima em resistir à erosão da água.
É nesta encosta que nos encontramos, suspensos na parte de vidro do Miradouro da Fraga do Puio
e suspensos também pela beleza da paisagem, “é fantástica. Da altura em que estamos a vista projeta-se a 2, 3 km de distância. O Douro que passa no fundo das arribas e a vista das áreas floridas é deslumbrante”
Este território do final do planalto mirandês são propriedade da Junta de Freguesia onde em cada pedaço de terra foram plantadas oliveiras e amendoeiras. As árvores são dos camponeses e a propriedade é comunitária”. A descrição é de António Ramos Preto. Nasceu em Picote (ou Picuote, em Mirandês) quase todas as vezes que regressa à terra natal vai ver a Fraga do Puio.
O território selvagem com pequenas marcas da intervenção humana: oliveiras e amendoeiras – há uma replantação de cerca de uma dezena de hectares, após um incendio em 2017 -, postes de eletricidade e uma pequena estrada de terra batida.
Para além do brilho das águas do Douro, conforme ilustra a foto de Edurado Domingues, o que domina é a aridez. Vegetação rasteira, blocos de granito e encostas enrugadas que se escondem nos vales. São o santuário das aves ao longo do Douro Internacional como no disse Margarida Telo Ramos, engenheira florestal, vive em Picote e foi colaborada do Parque Natural. – “o vale é muito encaixado e cria as condições adequadas para muitas aves escolherem as rochas para ninhos.
As escarpas funcionam como proteção do homem para muitas espécies que ali nidificam como por exemplo águias, abutres e cegonha preta”.
Picote está inserida no Parque natural do Douro Internacional. A aldeia fica a dois passos do miradouro e é também de visita obrigatória. Vai notar de imediato que a toponímia, a informação dos monumentos e sítios e o curso da vida se expressa em Mirandês.
Como também a hospitalidade das gentes, a arquitetura e igualmente a economia tradicional familiar de subsistência com pequenas hortas. “As arribas do Douro são graníticas e mais para o planalto o solo não é muito fértil e chove pouco. Mesmo assim, em muitas aldeias vemos as picotas, poços, as hortas que são espaços muito importantes para as pessoas.
São cultivos em terrenos mais férteis e em Picote”, na opinião de Margarida Telo Ramos, “tem a particularidade de haver pequenos pedaços no interior da aldeia.”
No passeio por Picote vemos as picotas, as fontes e no Ecomuseu Terra Mater encontramos alguns instrumentos associados à agricultura, como também a outras práticas tradicionais.
O projeto é da iniciativa da Frauga, uma associação de desenvolvimento local que aposta igualmente na salvaguarda do rico património cultural e natural de Picote.
Era bom que outros tivesse o mesmo zelo na outra aldeia da Freguesia, em Barrocal do Douro, onde se encontra ao abandono um fabuloso património arquitetónico.
São vários edifícios do tempo da construção da barragem, entre 1954 e 1958. O conjunto é designado por Moderno Escondido.
A arquitetura é moderna, com forte influência da escola de arquitetura do Porto. Algumas eram as moradias dos quadros mais qualificados que participaram na construção da barragem ou, nos anos seguintes, na manutenção do complexo hidroelétrico.
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A arquitetura surpreende-nos, o enquadramento paisagístico no topo da montanha com vista para a barragem supera o nosso espanto e, depois, levamos um choque aos constatarmos o abandono e a degradação da criação humana.
Como sucedeu em muito outros projetos fronteiriços – de Portugal e Espanha – os recursos locais são aproveitados quase em exclusivo para benefício das grandes e distantes urbes.
Razão tem o arqueiro gravado nas rochas da Fraga do Puio, mesmo em frente ao rio Douro, que não diz a ninguém para onde lançou a seta. A presa ninguém a leva e é um segredo que os especialistas calculam que terá entre 4 a 7 mil anos.
Suspensos no Miradouro da Fraga do Puio faz parte do programa da Antena1 Vou Ali e Já Venho, e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.
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