O Vale dos Amores é um antigo povoado entre Meimão e Meimoa e foi abandonado há cerca de meio século. O isolamento protegeu o casario de xisto e ainda podemos percecionar o modo de vida dos habitantes, nomeadamente das bonitas raparigas que estão na origem do nome do lugar.

site_vale_amores_2569O Vale dos Amores fica próximo da estrada principal, mas está escondido num vale.
Há dois núcleos de casas velhas de xisto. Tem muitas árvores e, devido à abundância de água, algumas habitações estão rodeadas de fetos, criando um bonito efeito decorativo.
site_vale_amores_2559Muitas habitações continuam de pé. Quase todas têm uma única porta e um postigo rasgado na parede para entrar um pouco de luz.
É através da luz natural que conseguimos ver alguns objetos deixados pelos últimos moradores. Vemos também como estava organizado o interior de cada habitação, a rotina familiar.
site_vale_amores_2547Honorato Neves, interessado pela cultura popular, promotor de um núcleo museológico na Meimoa sobre etnografia, recolheu há alguns anos testemunhos de três mulheres que nasceram e viveram durante muitos anos em Vale dos Amores. “Elas contaram-me dentro das casas onde faziam a cozinha e onde dormiam.

O quarto da casa
O quarto da casa

Costumavam dizer que dormiam ao monte. Quem dormia no quarto era o casal. Sempre. Nota-se nas casas o compartimento fechado onde dormia o pai e a mãe. O resto era à molhada.”

Honorato Neves
Honorato Neves

Honorato Neves registou em fotografias o regresso ao Vale dos Amores da “ti Palmira, a ti Isabel Paca, a Bia do João Tónio. Gostaram de ir ver e se calhar. Isto foi há alguns anos e naquela altura já não havia mais ninguém para contar histórias do Vale dos Amores”.

site_vale_amores_2546Um dos aspetos importantes da visita é que percebemos no próprio local como era rude a vida dos pequenos agricultores que trabalhavam para sobreviver. “Dificuldades de sobra. Fartavam-se de trabalhar para dar o sustento aos filhos, à família.”

O povoado teve origem há quase um século, com três irmãos a adquirir o terreno porque eram rendeiros numa quinta e os donos queriam eles próprios explorar a terra. “A Eirinha era uma quinta um pouco mais à frente onde os rendeiros eram quase todos da Meimoa. Pessoas com gado, ovelhas, cabras, vacas e pagavam uma renda a uma senhora rica de uma família de Penamacor.
site_vale_amores_2590Diz-se que por volta de 1928 os donos da quinta contrataram pastores e ganhões, muitos deles da Meimoa e passaram eles próprios a explorar a quinta. Quem lá estava como rendeiro teve de sair, de arranjar uma casa para a família. Foi o que fizeram esses três irmãos que compraram o Vale dos Amores.”

site_vale_amores_2564A procura do terreno conjugou-se com a urgência de um padre em vender a propriedade que na altura se chamava quinta dos Escaramouços. “O bispo terá dado ordem de expulsão ao pároco de Meimão que era o dono daquela quinta. Reuniram-se os três irmãos e compram a quinta ao padre. site_honorato_2556Os irmãos dividiram a quinta em três partes. O terreno tem uma fronteira a meio, um ribeiro. Um dos lados tem uma parte maior onde ficaram dois irmãos. O restante ficou na outra parte da quinta. Na altura não havia aquelas casas. Foram os três irmãos que as construíram. e depois o povoado foi aumentando com o crescimento do numero de pessoas e de mais casais.”

site_vale_amores_2555Ao longo do tempo o número de famílias e o povoado foi aumentando, “nasceu lá muita gente. Lembro-me do meu tempo de escola, do Vale dos Amores e mais uma ou duas quintas por ali, vinham grandes ranchos de garotos para a escola. Vinha tudo a pé. O povoado teria por volta de 20 famílias.”

site_vale_amores_2593O ribeiro que divide a quinta ajudava os trabalhos agrícolas, mas a quinta era mais conhecida por ter raparigas bonitas. “Há quem diga que entre 1930 e 35, o Dr. Mário Bento, o homem do museu da Meimoa, ouviu falar que a quinta dos Escaramouços tinha muita rapariga nova. Um dia fez uma caminhada e foi lá. Quando viu aquele vale cheio de fruta, cultura de batata, feijão, muita água e quando viu também aquela juventude toda, o Dr. Mário teve a expressão: Que lindo vale de amores! Daí para a frente ficou com esse nome.”

site_vale_amores_2586Ficou o nome de Vale dos Amores mas a vida difícil não encantava os mais novos. Emigraram e os mais idosos ficaram até poderem. “As ultimas pessoas que viveram lá, eu lembro-me de virem para o povo já com alguma idade. Por volta da década de 70 essas pessoas vieram viver para a povoação. Eram casais que estavam sós. Os filhos já tinham tratado da vida, casado, filhos… e quando vieram para aqui foi o casal com alguma idade.”

site_vale_amores_forno_2552
Um dos fornos do povoado

Entre a vegetação densa, os fetos, as construções rudimentares, a eira comunitária e o universo isolado da comunidade, retenho a imagem de uma das habitações. Restam ainda as pedras de xisto que se projetam para fora da parede, serviam de floreiras onde colocava os cravos. Junto à porta estava habitualmente uma pedra de granito, o banco onde Joaquim Costa se sentava à noite.

site_vale_amores_harmonio_2573
Casa de Joaquim Costa, tocador de harmónio

“Eu achava interessante a parte cultural deles. Tínhamos um homem em que eu era rapazola e ainda fui a uns bailaricos onde ele tocava o seu harmónio. Ele era a alegria do Vale dos Amores. Tinha um harmónio, chegava à noite, depois de tratar das hortas, dos animais… Toda a gente que vivia ali tinha umas cabras, ovelhas, uma vaca ou duas, um burro… e há noite comiam a ceia abreviada, sopa e pouco mais, e ele divertia aquela gente toda.”

site_meimoa_praia_fluvial2_hdr
Praia fluvial de Meimoa

No dias de hoje, em particular no Verão, são outros os lugares de encontro de raparigas bonitas e de vales de amores, como por exemplo, a praia fluvial de Meimoa.

site_vale_amores_2542O Vale dos Amores faz parte do programa da Antena1 Vou Ali e Já Venho, e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.

O Vou Ali e Já Venho tem o apoio:Af_Identidade_CMYK_AssoMutualistaAssinaturaBranco_Baixo

Comments

No comments yet. Why don’t you start the discussion?

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *