O Queijinho do Céu é um doce de ovos e amêndoa, tem o formato de um pequeno queijo de cor amarelada e está escondido num embrulho de papel branco rendilhado.
“É como desvendar um mistério. Ao descobrir o queijinho está a descobrir um mistério. Esse mistério é comer o doce, saboreá-lo e vai ao céu por momentos.” A descrição é de Luís Gonçalves que tem um café na praça de Constância. Há cerca de 26 anos que vende os Queijinhos do Céu feitos de forma artesanal pelas Irmãs Clarissa do Mosteiro de Nossa Senhora da Boa Esperança, no lugar vizinho de Montalvo.
“As freiras começam por escaldar a amêndoa para tirar a pele, secam, moem, manuseiam o miolo da amêndoa com o açúcar e uma clara de ovo é capaz de dar para umas 20 unidades. Enformam, usam uma caixa cilíndrica na qual introduzem o doce de ovo. Depois tapam a caixa e esperam um dia ou dias de forma a que a amêndoa, se tiver óleo, possa escorrer. Terminam com este papelote à volta, todo bonito e que lhe dá a gracinha.”
As religiosas estão desde o século XIX no Mosteiro e os Queijinhos do Céu ganharam fama e distinção entre a doçaria conventual. Mas as freiras envelheceram, são menos e desde este ano já não produzem o doce de forma regular.
Cheguei a provar alguns e, de facto, têm um sabor e uma textura diferente dos que são feitos por duas ou três pessoas que em Constância procuram manter o legado. Uma delas é Sara Nunes que tem uma loja também na praça central. “Os meus, pelo que ouço as pessoas dizer, são ligeiramente diferentes, mais espessos e a massa de amêndoa também fica um pouco mais grossa. Os outros têm uma massa mais fina ou o doce mais líquido e não sabem tanto a amêndoa amarga.”)
Aparentemente, a receita não é muito complexa: “a massa é só amêndoa e açúcar e o doce é de gema e açúcar. A amêndoa é triturada de forma fina, o açúcar é em pó, faz-se a mistura, unta-se com clara e fica o género de uma pasta. O doce vai ao lume engrossar as gemas com açúcar.”
O legado das Irmãs Clarissa parece ter continuidade e uma das minhas surpresas foi o baixo preço, tendo em conta que se tratava de um doce conventual feito à mão e de modo paciente.
Bem diferente dos tempos em que os ricos pediam às religiosas para lhes fazer a doçaria em momentos especiais como recorda Luis Gonçalves – “isto era um doce conventual. Era caro, fazia-se apenas quando havia banquetes. Não era normal encontrar-se disponível em qualquer sítio.”
Camões deve-se lamentar de quando andou por aqui, por Constância, Vila Poema, ainda não haver os Queijinhos do Céu.
Queijinhos do Céu e da perdição faz parte do programa da Antena1 Vou Ali e Já Venho, e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.
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