A igreja de Nossa Senhora dos Navegantes, no Parque das Nações, em Lisboa, tem traços arquitetónicos singulares e é um exemplo de como uma estrutura minimalista ganha imensa beleza.
Há a função de culto, que determina a sua forma, mas a arquitetura e o enquadramento com a ponte Vasco da Gama em cenário de fundo, capta de imediato a atenção.
A igreja de Nossa Senhora dos Navegantes tem uma torre de 40 metros de altura, como se fosse um campanário, mas é mais uma expressão de uma mensagem religiosa.
O mesmo sucede com a forma circular do edifício e com uma enorme cruz de vidro incrustada na parede.
Contrasta com a pedra que domina a fachada e tem vários significados, seguindo as palavras do padre Paulo Franco. “Em primeiro lugar todos os templos cristãos têm uma identificação que é a cruz de Cristo.
É o símbolo dos cristãos e os edifícios no exterior têm essa identificação. Neste caso o arquiteto decidiu colocá-la em negativo, por duas razões.
Em primeiro lugar, para deixar passar alguma luz para o interior. O vidro que está por detrás da cruz vai ser alterado. Vai ter um vitral do Batismo do Senhor. A cruz torna-se também vida. Pela luz que ela irradia é uma luz que não é morte, mas é vida. É isso que nós acreditamos na fé cristã. A cruz de Cristo não é sinal de morte, mas de vida eterna.”
O facto de a estrutura estar incrustada na parede remete para outra ideia, “não é um objeto colocado, mas antes inerente. Não se pode tirar. É a própria cruz que constrói o edifício.”
Percebemos melhor a interpretação do padre Paulo Franco quando entramos na igreja e vemos a luz natural da cruz a irradiar pelo teto da nave até à parede atrás do altar. Até ao retábulo onde se encontra a representação de Jesus Cristo, a Transfiguração do Senhor, num estilo parecido com a do mural.
É para o altar que todos os elementos arquitetónicos convergem, com linhas circulares. Até os bancos de madeira, acentuando a comunhão entre quem assiste aos rituais.
“O outro não me é um anónimo como eu também não sou perante ele. Por outro lado, ambos participamos no mesmo acontecimento, somos protagonistas da mesma liturgia que está a ser celebrada. Tem um presidente com a figura de Cristo mas, na qual, também somos protagonistas. A forma circular é a que melhor vai ao encontro desse principio. O próprio edifício ter a forma circular é consequência do que acontece no seu interior.”
Uma outra particularidade da igreja é ser minimalista. São poucos os elementos decorativos e alguns materiais são naturais. São exemplo madeira e pedra bruta. Dois blocos servem de suporte ao altar, outra mais alta é a base do ambão.
A mais surpreendente é o Batistério. A pedra é de grandes dimensões, arredondada, de faces irregulares e porosas. A única face polida é a concavidade da água benzida.
“O Batistério, o altar e o ambão são feitos com base em matéria bruta, em pedras toscas tiradas da natureza, do seu meio ambiente.
Foram apenas limpas e trabalhadas para o seu enquadramento e servirem de suporte das peças de excelência da liturgia. Dos sacramentos que se celebram: o batismo, da eucaristia e da palavra.
Há depois o contraponto de uma pedra mais polida, mais nobre que assenta nessas pedras toscas, na matéria bruta.
É, de certa forma, o confronto entre a presença de Deus no humano. A liturgia procura isso, essa presença do divino no humano e o humano que se transforma também pela presença do divino.
Vemos isso no ambão, no altar e no Batistério com a parte polida onde a água benta assenta.”
Além destas esculturas em pedra, de Armindo Alípio Pinto, destacam-se a representação da Via Sacra, algumas peças de arte sacra e a escultura da Senhora dos Navegantes, numa galeria lateral que, na altura da minha visita à igreja, havia a expectativa de em breve ser acompanhada de outra.
“O conjunto são duas peças escultóricas. A padroeira e o padroeiro secundário da igreja. A padroeira é Nossa Senhora dos Navegantes e o padroeiro é São Paulo.”
A igreja foi inaugurada em 2014 e o projeto é da autoria do arquiteto José Maria Dias Coelho.
A ideia remonta a 2006 e já nessa altura Paulo Franco era o pároco da Paróquia do Parque das Nações e desde o início registou a reação de quem entra pela primeira vez na igreja. Uma delas é “o ambiente de oração de intimidade e de silêncio que sentem”. Outra é “a sensação arquitetónica de que o próprio espaço me faz participar no que nele acontece.”
De certa forma, a reação das pessoas vai ao encontro dos dois grandes princípios que nortearam o projeto arquitetónico: “o espaço da igreja deve ser o lugar da oração e a “escola da comunhão”. Que a pessoa quando entre se sinta numa dimensão que o transporte para uma transcendência, uma relação com Deus, e ao mesmo tempo faça uma experiência comunitária, de comunhão com aqueles que professam a mesma fé e que celebram os mesmos mistérios.”
A igreja tem lotação para mais de um milhar de pessoas e o complexo tem outras estruturas de apoio à comunidade paroquial.
O traço singular da igreja de Nossa Senhora dos Navegantes do Parque das Nações faz parte do programa da Antena1 Vou Ali e Já Venho e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.