Santo António da Neve fica num dos pontos mais altos da serra da Lousã, no concelho de Castanheira de Pera. A transformação da neve em gelo deixou um património interessante a que se junta a beleza natural de um lugar quase isolado.
Santo António da Neve é um irmão gémeo do Alto de Trevim, o ponto mais alto da serra da Lousã, ao atingir os 1200 metros de atitude. Ficam frente a frente.
Santo António da Neve é ligeiramente mais baixo, poucas dezenas de metros, e tem a particularidade de ser um lugar mais isolado. Um refúgio encantador com um ambiente natural, muito arborizado e sente-se o silêncio.
Num pequeno planalto encontramos uma capela isolada, branca. Uns metros mais acima, vemos três poços onde antes se fazia gelo. No passado eram sete. Restam três e o que sobressai tem uma altura no exterior de quatro a cinco metros e uma cobertura redonda. Em forma de abóbada.
Os poços são de xisto e estão entre um denso arvoredo que garante uma sombra quase permanente. As portas dos poços, segundo a Monografia do Concelho de Castanheira de Pera de Herlander Machado, estão viradas para nascente para evitar o efeito do sol.
As paredes viradas a norte a até os troncos de árvores estão cobertos de musgo.
A localidade mais próxima é Coentral, cerca de 12 quilómetros abaixo na encosta da serra. Era daqui que nos dias de inverno muita gente caminhava até ao Cabeço do Pereiro, que, entretanto, ganhou a designação de Santo António da Neve, após a construção da capela no final do século XVIII.
Paula Claro diz que a “população do Coentral era contratada diretamente pelo rei através do neveiro-mor. A população ia apanhar a neve no alto da serra onde existiam os poços construídos em pedra. A neve era colocada dentro dos poços onde estava alguém a calcar a neve, transformando-a em gelo”
Paula Claro é presidente do CIRUC, Centro de Instrução e Recreio União Coentralense que, a par do Rancho Folclórico Neveiros do Coentral, procuram manter viva a herança dos neveiros.
Podemos ver o interior de dois poços. Já não têm os 10 metros de profundidade que chegaram a atingir e onde a neve era calcada com maços de madeira para a comprimir e formar gelo. Ficava depois coberta com palha durante alguns meses.
“Quando chegava a Primavera, início de Verão, o gelo era cortado em grandes cubos. Depois eram embrulhados em palha e serapilheira e transportados em carros de bois até Constância ou Barquinha. Seguiam depois de barco até ao Terreiro do Paço.
Abasteciam a corte de gelo, para que o rei e a corte pudessem comer gelados e bebidas frescas no Verão. O que sobrava era vendido no Martinho da Arcada e noutros nos cafés de Lisboa.”
O fornecimento de gelo da Lisboa era partilhado com outra unidade de produção. No alto da serra da Montejunto, também sob controlo do neveiro-mor, mas com uma técnica diferente.
A profissão de neveiro terminou no final do século XIX.
A capela, mandada construir pelo neveiro-mor da casa Real andou depois por mãos privadas e em meados do século passado foi adquirida pelo município de Castanheira de Pera. Ao lado tem uma lápide comemorativa dos 200 anos e a evocação do povo de Coentral aos antigos neveiros.
Os poços estão classificados como Imóvel de Interesse Público.
Do planalto temos uma vista ampla da serra da Lousã, em particular do Alto de Trevim.
Desta zona nasce a ribeira das Quelhas que próximo do Coentral vamos acompanhar num deslumbrante passadiço.
1200 metros a galgar a encosta da serra.
Santo António da Neve que transformavam em gelo faz parte do programa da Antena1 Vou Ali e Já Venho e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.