Uma calçada romana sobe a Gardunha, orienta-nos pelo interior labiríntico da aldeia e transporta-nos por uma história de séculos que nos vai levar ao céu no Palácio do Picadeiro. Sim, ao céu.
O telhado do Palácio é em vidro e o azul do céu brilha mais que o granito das paredes.
No terraço a vista percorre o vale e alcança Monsanto. As torres das igrejas e o casario a descer a encosta acrescentam cores fortes no horizonte que o torna ameno e fresco no Verão.
Não é assim de estranhar que Alpedrinha tivesse sido eleita pela nobreza e seja vizinha de Vale de Prazeres.
A serra protege a vila dos ventos do Norte, a água corre pelas encostas e o terreno é fértil. Um ambiente convidativo para famílias com poder económico construírem aqui solares, casas apalaçadas, como é o caso mais emblemático do Palácio do Picadeiro
Foi construído no séc. XVIII por um magistrado mas a obra ficou por terminar porque se foi esgotando o dinheiro. O edifício teve vários donos e desempenhou várias funções. Foi sede de um tribunal, hospital e até tipografia do jornal Estrela da Beira, em meados do séc. XIX.
Durante muitos anos esteve ao abandono e há menos de uma década foi recuperado e transformado num espaço de divulgação cultural.
Tem uma sala dedicada a trabalhos de marcenaria, com a técnica de embutidos de madeira para efeitos decorativos.
Uma das apostas é um espaço sensorial. Com a sincronização de luz e som que nos faz sentir a vivência das quatro estações num ambiente serrano. Esta aposta está agora a ser ampliada a outros espaços e outros sons.
A entrada é por uma porta lateral em frente de um pátio grande. É aqui que reside o nome do Palácio. Era neste pátio que eram domados os cavalos, que funcionava como um picadeiro e o nome ficou.
O pátio é vizinho de outro ícone da vila e é também um belo exemplo de cantaria: o chafariz D. João V.
É enorme, de granito e com trabalho pormenorizado em cada face onde estão as três bicas. O chafariz, segundo a referência registada no site do IPPAR foi mandado edificar por D. João V em 1714, este chafariz barroco, designado como um dos maiores do país, foi traçado sobre a calçada romana, segundo um projecto da autoria de Valentim da Costa Castelo Branco, um engenheiro do Exército natural de Alpedrinha.
Ainda segundo a mesma referência, a calçada romana serviu de base ao traçado urbano medieval e não sofreu grandes alterações até aos dias de hoje.
Por esta calçada romana passaram pastores do Norte do Tejo que faziam todos os anos a transumância até à Serra da Estrela, por Alpedrinha passavam os almocreves e também por aqui passaram várias vezes os militares das Invasões Francesas que fustigaram as pessoas destes povoados. Mataram, saquearam e destruíram. O memorial, com os nomes de cada uma das vítimas, regista estes dias de violência em 1808.
A religião cristã tem também uma forte presença na vila.
Há várias igrejas e capelas. Uma delas, a Capela de S. Sebastião fica próxima do Palácio do Picadeiro. A Igreja Matriz tem sete altares e um órgão de tubos do séc.XVIII. Em Alpedrinha há também um museu de arte sacra.
Foi também aqui que nasceu o famoso Cardeal de Apedrinha que alcançou imenso poder na Igreja e criou a Santa casa da Misericórdia de Lisboa.
O teatro em Alpedrinha é outro registo que não pode passar despercebido, mais ainda porque foi o primeiro em todo o distrito de Castelo Branco. Foi fundado em 1839. Passou por vários locais e conseguiu sobreviver até aos dias de hoje com a Companhia Teatro Clube de Alpedrinha. No Aqui Há Beira encontra informação sobre a programação do Teatro e de outras organizações no concelho do Fundão.
Uma outra atividade cultural tradicional em Alpedrinha foram as escolas de música e bandas filarmónicas. Ganharam imenso prestígio que em toda a Raia uma romaria para afirmar a sua pujança tinha de ter a banda filarmónica de Alpedrinha. A tradição musical ganhou tal força que fazia sentido o dito popular: em Alpedrinha até os gatos sabiam música. As filarmónicas hoje já não existem. Alguns instrumentos estão no Museu da Música, a casa da Família Osório onde se estão também em exposição partituras de compositores de Alpedrinha.
Da Portela de Alpedrinha, no dorso da gardunha, o contraste é impressionante entre as serranias que, pelo Norte, barram o horizonte próximo e o planalto a que não se vê o fim: sobre ele, as manchas de verdura vão-se tonando cada vez mais desbotadas, indecisas e distantes. Na verdade, é o Alentejo que começa.
Portugal, o Mediterrâneo e o Atlântico; Orlando Ribeiro
Alpedrinha é um segredo bem guardado faz parte do programa da Antena1, Vou Ali e Já Venho, e pode ouvir aqui.
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