Muitos portugueses foram seduzidos pelo Brasil. Registaram-se vários fluxos emigratórios, em particular da região das Beiras e do Minho. Uma dessas vagas decorreu em meados do século XIX e, quando regressavam, deixaram uma marca que permanece até aos dias de hoje e que resulta de um forte processo de aculturação. Na verdade, é um dos casos onde mais se sente as raízes da “dupla nacionalidade”. Onde a palavra “saudade” é compreendida nos dois lados do Oceano Atlântico.
No entanto, o emigrante português que regressou do Brasil no século XIX foi algumas vezes ridicularizado na nossa literatura, essencialmente na época do Romantismo e por alguns escritores como Camilo Castelo Branco.
O próprio Eça de Queiroz o refere rebatendo a imagem que foi traçada de barrigudo, de bigode, com roupa exótica e “voz adocicada”.
Em muitas regiões do país onde a emigração para o Brasil era o único escape para conseguir sustento para a família e que era testemunhado por alguns que regressavam com posses, ficou enraizada a expressão “o brasileiro”.

Medelim
Medelim

Por exemplo, neste dias, numa pequena aldeia de Idanha a Nova, em Medelim, em frente de uma casa grande, com varandas, com uma escadaria para um jardim e com paredes trabalhadas em pedra, a conversa só tinha um sujeito: o brasileiro. MedelimO brasileiro que financiou a construção da casa e fez obras de beneficência. “Algumas das obras num santuário religioso e na torre da igreja foram financiadas pelo brasileiro. Só assim era conhecido. Nunca regressou à aldeia” testemunha uma mulher.
Do brasileiro, além das obras, ficaram memórias de muitas histórias, a fotografia que a habitante da aldeia diz ter visto no santuário e o agradecimento do povo através de uma cantilena dita numa procissão: “quem vos deu o guião verde; foi um senhor brasileiro; de uma doença que teve.”
Casa da Ínsua, Penalva do CasteloPor todo o país há muitas outras histórias dos chamados brasileiros que tiveram uma participação activa em obras, essencialmente de carácter social e também em aletrações na agricultura e na arquitetura.
No regresso, os lucros obtidos no Brasil, eram aplicados na melhoria das casas de família e, segundo o estudo Representações materiais do “Brasileiro” e construção simbólica do retorno, de Miguel Monteiro, introduziram também uma melhoria significativa na agricultura, essencialmente no Norte de Portugal. Segundo o mesmo estudo, a grande marca foi na paisagem urbana de cidades e vilas.

São um dos primeiros anúncios de ruptura da apiagem rural portuguesa. São construídas por emigrantes vindos do Brasil, numa das primeiras vagas de regressados do exterior. As casas dos brasileiros situam-se geralmente em pontos-cheva da apisagem, por forma a serem vistas de longe, e ostentam riqueza por oposição ao mundo em que se inserem. Portugal, o Sabor da Terra, Jose Mattoso, Suzanne Daveau, Duarte Belo.

A capacidade financeira, o conhecimento e a disponibilidade para atividade sociais também os levou a ocuparem lugares cimeiros em organizações locais.

Estátua do Conde de Ferreira em frente do Hospital
Estátua do Conde de Ferreira em frente do Hospital

Por exemplo, o Hospital dos Covões, em Coimbra, resulta em grande medida de dinheiro de emigrantes portugueses no Brasil para a construção do Hospital-Sanatório da Colónia Portuguesa no Brasil que, está quase a fazer um século. Pretendia suster o forte crescimento de tuberculose em Portugal.
Mais ou menos na mesma altura, a Câmara Portuguesa de Comércio de São Paulo, financiou a construção de cinco escolas em lugares menos favorecidos.

Escola Conde deFerreira em Alcochete
Escola Conde deFerreira em Alcochete

No âmbito da saúde e da escolarização um grande passo foi dado pelo comendador Conde de Ferreira, emigrado no Brasil. Promoveu o hospital, no Porto, que ainda está a funcionar, e a construção de uma centena de escolas primárias. Eram praticamente todas iguais. Resistem cerca de sete dezenas e são facilmente identificadas pelo frontão triangular com a inscrição “24 de Março de 1866”. É a data da morte do Conde de Ferreira. Uma dessas escolas foi no Montijo.

Fachada da escola conde de Ferreira no Montijo
Fachada da escola conde de Ferreira no Montijo

Segundo o seu testamento disponibilizou 144 000 000 réis para a construção de 120 escolas. As construções tinham requisitos específicos no que foi a primeira planta escolar a nível nacional, com duas salas e um espaço para habitação do professor.
Joaquim Tapadinhas, historiador e autor de um estudo sobre o ensino no concelho de Montijo, frequentou esta escola em 1946.
site_escola_DSCF8209A escola começou a funcionar em 11 de Fevereiro de 1875 e foi a primeira escola pública de ensino primário no concelho do Montijo. Hoje pode-se visitar, funciona o Museu do Pescador. Em muitos outros locais foram também pioneiras na escolarização e hoje são usadas para múltiplos fins, como por exemplo sede de juntas de freguesia.
O brasileiro faz parte do programa da Antena1, Vou Ali e Já Venho, e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.

O Vou Ali e Já Venho tem o apoio:Af_Identidade_CMYK_AssoMutualistaAssinaturaBranco_Baixo

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