Atouguia da Baleia é uma pequena vila do concelho de Peniche com um rico património e uma forte relação com o mar, da qual agora dista alguns quilómetros.
A vila, ainda antes da fundação de Portugal, tinha uma zona costeira importante, protegida por uma ilha que é hoje Peniche. Durante vários séculos Atouguia foi um dos mais importantes portos do reino.
Devido à sua localização não se estranhe, por isso, a presença de reis, do primeiro almirante da marinha portuguesa e até de uma enorme baleia que em 1526 deu à costa e o facto ficou perpetuado no nome da vila e no imaginário local. Chega aos dias de hoje com outro elemento: a presença de um osso de baleia no interior da igreja de S. Leonardo.
“O osso de baleia, não sendo da igreja, povoou o imaginário das pessoas porque há a identificação de que aquele osso teria sido retirado da igreja no âmbito da intervenção de recuperação na década de 70 do século XX.”
No entanto, refere ainda Rui Venâncio, historiador e coordenador da área da Cultura do município, “aquele osso provém de Peniche mas evoca um pouco a história da própria vila, centrada na atividade piscatória”.
O osso encontra-se no interior da bonita igreja de S. Leonardo que está classificada como Monumento Nacional. Ainda nas palavras de Rui Venâncio, “é uma igreja de grande imponência e onde encontramos a transição entre o românico e o gótico. Data do século XIII.”
A igreja é enorme, parece uma fortaleza e o interior tem uma decoração muito austera.
Tem 3 naves, o olhar centra-se na Capela Mor.
Um outro destaque é uma peça em calcário branco. Está embutida numa parede tem várias figuras e uma mulher atravessa todo o cenário.
Trata-se do retábulo da Natividade e “é uma peça notável.” Está associado à cultura popular, a um dos atributos que o povo vê em São Leonardo, que tem a ver com as parturientes.
“Nesse sentido há uma série de elementos decorativos da igreja que nos levam à temática da natividade. Um deles é este retábulo em baixo relevo”
A Rainha D. isabel, que tem uma estátua no espaço exterior também tem uma relação com o retábulo. Atouguia esteve na posse da rainha e uma lenda diz que “certo dia, o infante D. Pedro, futuro rei D. Pedro I, estaria doente e a rainha foi rezar de forma muito fervorosa à Natividade. De repente houve um estrondo e ela reparou que a peça estaria fissurada de um lado ao outro. Hoje vemos ainda a peça fissurada. A rainha regressou depois ao paço na Serra d’El Rei e o seu neto, D. Pedro, estaria curado”.
Outra marca do domínio de Atouguia da Baleia é o tumulo do primeiro conde de Atouguia. Está na Capela Mor da igreja de S. Leonardo. Tem o brasão destruído por vontade do Marquês de Pombal, na sequência do Processo dos Távoras. O mesmo sucedeu com o pelourinho que está na praça em frente da igreja e dos antigos Paços do Concelho.
A relevância de Atouguia atraiu muitas outras famílias nobres, foi ponto de passagem de reis e, por isso, também teve espaços de entretenimento. Vários esteios de pedra, com perfurações retangulares e todos alinhados no largo junto à igreja da Senhora da Conceição é um dos testemunhos.
“O Touril não está na sua disposição original, mas corresponde à única estrutura que é conhecida em Portugal. A origem é do século XVII e tem a ver com o lidar dos touros. A tauromaquia é uma arte antiga e que teve um grande desenvolvimento no século XVII, naquele espaço. Aproveitando a vinda da família real e da corte teriam lugar algumas atividades neste domínio e o touril era uma estrutura que dava apoio a essa prática tauromáquica” adianta Rui Venâncio
Há a referência de que nesta região existiam muitos touros selvagens e que o próprio nome da vila, pelo menos desde o século XII, seria de Touria. A designação acabou por evoluir para Atouguia. É uma explicação. Não é a única. Outra possibilidade sobre a representação do touro na identidade da vila remete para o brasão original, para o tempo dos cruzados que participaram na Reconquista.
“Essa referência ao touro, julga-se, terá a ver com o primeiro donatário da vila de Atouguia. Era um cruzado que veio participar na tomada de Lisboa em 1147. Chamava-se Guilherme de Corni e recebeu do rei D. Afonso Henriques a chamada Herdade da Atouguia. Ele acaba por vir povoar este território e também com o dever de o defender da pirataria e de ataques dos muçulmanos. É possível que esta representação do touro tenha a ver com a família Corni.”
Esta referência histórica é assinalada com o desenho de touros na calçada de alguns passeios.
O assoreamento e as alterações da costa mudaram radicalmente a geomorfologia da região. Peniche desempenha hoje o papel de Atouguia no passado.
Um bom ponto de partida para a descoberta de Atouguia da baleia é o Centro Interpretativo que está localizado na igreja de S. José.
Atouguia da Baleia e do touro faz parte do programa da Antena1 Vou Ali e Já Venho e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.