As mantas de Minde são muito mais do que um produto têxtil. Fazem parte da história de vários séculos de uma comunidade que vive num vale pobre entre as serras de Aire e Candeeiros.São o ícone de uma cultura de sobrevivência que até os levou a criar uma fala secreta, o minderico.

Mafalda Menezes, tecedeira do Atelier de Tecelagem das mantas de Minde, começa por nos dizer em minderico que “atazanamos as menízias”, ou seja “tecer as mantas”.

Foi no passado uma actividade que marcou a comunidade local e a manufatura era feita maioritariamente por mulheres. “As mantas eram o sustento familiar da população de Minde, por volta de 1900. Construíram teares em pedra, madeira, ferro… tudo muito simples e artesanal”.
A produção de mantas através de teares de madeira atingiu uma dimensão considerável.

“Chegou a haver cerca de 200 teares em Minde. Contam as pessoas com mais idade que era uma beleza passear na rua e ouvir o bater dos teares. Trabalhavam todos os dias e ao fim de semana iam vender as mantas para sustento familiar.”
Mafalda Menezes refere-se à rotina em Minde há quase um século, quando do período áureo da manufatura das mantas. A industrialização e mais recentemente a crise nos têxteis colocou fim ao bater dos teares.

A exceção é no Atelier de Tecelagem do CAORG, Centro de Artes e Ofícios Roque Gameiro, onde, além de muitos outros instrumentos antigos, como fusos, dobadoiras e rodas, vemos ainda os antigos teares de madeira. “Um deles é muito antigo. Tem peças novas, mas outras com mais de cem anos.
Temos mais dois teares recentes que foram adquiridos para manter a tradição dos tecelões. Somos três” refere ainda Mafalda Menezes.

Os visitantes podem vê-los a trabalhar, observar o sincronismo do corpo com o tear ao ritmo do bater da madeira. “Contamos às pessoas a história das mantas eexplicamos todo o processo de fazer de fabrico. A reação habitual é de espanto.
Por outro lado, como o bater dos teares é barulhento, algumas pessoas passam na rua, ficam curiosas e entram para ver.
É também interessante a reação de pessoas que viveram em Minde há muitos anos e quando regressam ficam admiradas ao descobrirem que ainda há teares a fazer a mantas. Algumas ficam por aqui a conversar.”

Mafalda Menezes gosta muito de fazer as chamadas mantas janotas. São muito coloridas, com barras de várias cores quentes, como vermelho e amarelo.
Seguimos quatro padrões. As mantas de Minde são todas coloridas. Por isso é que são janotas. O termo significa colorido, bonito. Há ainda o padrão pardo com as cores do arco-íris. Só a manta mais antiga, que surgiu no século XIX, a chamada manta preta, é que tem as cores naturais da lã. Pesam cerca de 3kg enquanto uma manta janota pesa cerca de 5Kg. A janota leva mais lã.”

Há algumas décadas atrás as mantas também eram utilizadas como vestuário. Para os pastores se protegerem do frio. “Tinha várias utilizações. Se o pastor ia para o pasto podia ser usada como capote. Era a peça fundamental num enxoval e eram usadas nas camas.
Hoje ainda há pessoas que gostam de as ver nas camas, mas aa maioria prefere colocar no chão. Como um objecto decorativo. Não temos muita venda, mas é grande a procura porque algumas pessoas desejam ter a verdadeira manta de Minde.”

Pequenas tiras de mantas são usadas para outros produtos que também podemos ver no atelier de tecelagem, como por exemplo calçado, malas e acessórios para casa.

Toda a produção é feita no atelier e com instrumentos tradicionais.

Há 7 anos que Mafalda Menezes é tecedeira, fala com gosto da sua profissão e do contributo para a salvaguarda de uma das marcas dos mindericos. É um contributo exigente. Rapidamente o concluímos quando a vemos no tear.

Ela reforça porque “não é fácil. Tem de haver coordenação, cabeça, tronco e membros. O tear está adaptado ao nosso corpo, ao comprimento das pernas, dos braços… É um trabalho de manufatura e exige saber, mas infelizmente não há quem queira continuar. É muito triste.”

Este é o seu lamento. Quem quiser pode aprender no Atelier de Tecelagem, mas utilizando a sua expressão, “ninguém quer”.

O universo da manufactura das mantas de Minde esgota-se no Atelier de Tecelagem e é vital para a continuidade dos tecelões. Na região há quem produza as mantas mas são outras janotas, “já não é 100% lã. Usam também fibras. O puro, o tradicional, como se fazia no tempo dos 200 teares em Minde, é só aqui.”

As janotas Mantas de Minde faz parte do programa da Antena1 Vou Ali e Já Venho e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.

4 Comments

  1. Luís Vasconcelos

    Boa tarde e parabéns pela arte e manutenção da tradição. Podem indicar onde, na região de Lisboa, poderei adquirir artigos vossos? Bolsas, mochilas, etc.. mantas já tenho, antigas. Obrigado

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