Na ementa de hoje pode escolher entre enguias fritas, escaladas, ensopado ou caldeirada de enguias. São os pratos confecionados de acordo com a tradição na freguesia de Benfica do Ribatejo, no concelho de Almeirim.
A popularidade das enguias nestes concelhos ribeirinhos do Tejo deve-se em grande medida “às cheias do rio que abrangiam uma grande área da lezíria. Os pescadores, quando das cheia, iam à pesca da enguia, barbo, fataça… eram peixes muito apreciados porque na altura eram baratos, ao contrário de hoje, e as pessoas acabavam por consumir. Então, tornou-se um prato muito típico na nossa freguesia.”
A explicação é de José Valério, o herdeiro da família que projetou a nível nacional as receitas de enguias de Benfica do Ribatejo. Até para o estrangeiro. Em anos normais é frequente surgirem com um mapa na mão à procura do Constantino das Enguias em Foros de Benfica.
“Habitualmente vêm pessoas de França, Alemanha, Suíça, onde há portugueses instalados e que nos jornais locais falam das enguias. Trazem um mapa e vêm aqui à procura das enguias. Nos países deles há pessoas que gostam, mas não é muito tradicional.”
Foi uma barraquinha à beira da estrada que deu fama às enguias desta região. Começou há quase 50 anos. O grande promotor foi Joaquim Valério, avô de José Valério. “Conheci o meu avô e trabalhei com ele durante alguns anos. Era um homem com uma personalidade muito forte, muito trabalhador e, acima de tudo, muito honesto. Sabia fazer um pouco de tudo. Começou na agricultura, depois vendia sardinha com uma bicicleta, com aqueles suportes mais largos para colocar a caixa das sardinhas. A partir daí percebeu que ganhava mais dinheiro a vender o peixe porta a porta. Foi aprender a arte da pesca e começou a pescar o seu próprio peixe. As enguias, as achegãs, na altura, carpas, os barbos e consoante apanhava vendia porta a porta.”
O passo seguinte foi a barraquinha à beira da estrada em 1974. “Por volta de finais de 1974 convenceu o meu pai a abrir um pequeno café à beira da estrada porque passava muita gente para ir à pesca. Ele convenceu as pessoas que estavam a pescar a pararem na tasca e a minha mãe cozinhava o peixe para eles comerem com vinho, pão … e o negócio foi andando.”
Era uma construção em madeira, chão de terra batida com bancos e mesas corridas. “Era a cerca de 500 metros deste local. Era o restaurante antigo, o Constantino das Enguias que era uma barraquinha, em Foros de Benfica.”
As enguias vinham da ribeira de Muge onde até ao 25 de Abril de 1974, existia uma reserva de pesca. “Naquela altura era uma concessão entregue à Escola Prática de Cavalaria de Santarém e aos ex-Leões de Santarém. Pessoa do Exército e dos ex-Leões vinham para aqui para a pesca. Como não tinham sítio para arranjar o peixe começaram a ir à barraquinha. Começou aí. A minha mãe cozinhava, conjuntamente com o meu avô. Como eles traziam enguias e não as sabiam amanhar, era o meu avô que fazia e a minha mãe fritava ou fazia o ensopada. Ela começou também a comercializar o peixe. O meu avô começou mais tarde também a apanhar e era a minha mãe que o vendia.”
No passa a palavra as enguias ganharam fama, o numero de clientes subiu significativamente ao fim de uma década e, como diz José Valério, “até que se tornou numa romaria.”
A ribeira de Muge continua a dar algumas enguias mas tiveram de diversificar o fornecimento. “Na ribeira de Muge é mais sazonal. Os pescadores que vão apanhar o lagostim do rio começaram a trazer enguias das barragens desta zona. Há muita enguia de barragem.”
No concelho de Almeirim, em particular na Freguesia de Benfica do Ribatejo há meia dúzia de restaurantes especializados em enguias e é habitual ser organizado um evento anual.
Para finalizar, uma recomendação: quando caminhamos por territórios pouco familiares devemos fazer como os locais. No caso, a opção é escolher os mesmo restaurantes e os mesmo pratos. Começamos pelos preferidos do avô de José Valério.
“O meu avô gostava de todos. Se fosse ao almoço gostava de comer uma boa caldeira ou um ensopado. Se fosse à noite, como era gente que comia muito cedo, anoitecia mais cedo e eles trabalhavam de sol a sol, preferia as fritas com arroz de feijão ou arroz de tomate. Eu prefiro as fritas. A acompanhar um amigo posso comer ensopado ou a caldeirada, mas o meu prato preferido é a enguia frita.”
Constantino das Enguias começou com uma banca à beira da estrada e deu fama às enguias da região faz parte do programa da Antena1 Vou Ali e Já Venho e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.