O Mosteiro S. Vicente de Fora é um dos edifícios mais emblemáticos de Lisboa. Em conjunto com a igreja marcam a nossa nacionalidade e, nos dias de hoje, além da beleza da arquitetura, tem um património fantástico. Até tem o tumulo de uma rainha de Inglaterra que pouco se destaca no panteão Real da Casa de Bragança, a quarta dinastia. Mas, há muito mais para visitar e que corresponde a vários perfis. “Temos os visitantes que chegam e ficam encantados, por exemplo, com a paisagem. Outros ficam com a quantidade de azulejos. Somos um dos monumentos do mundo com mais azulejos colocados em local original. Há outros que ficam perplexos em encontrarem aqui o panteão dos Bragança, praticamente toda a nossa quarta dinastia, entre outras exposições.
Temos a galeria dos patriarcas, exposições de conchas, arqueologia, arte sacra, uma sacristia com paredes revestidas com mármores embutidos. Têm muito por onde explorar.”
O edifício é também a sede do Patriarcado e Joana Santos é a coordenadora do Mosteiro.
Ela própria também se deslumbra com o terraço da igreja onde “temos um dos melhores miradouros de Lisboa.
É um miradouro de 360º e atrai muitas pessoas. Podemos ver as duas pontes de Lisboa. Tem uma vista espetacular do Panteão que está ao lado ou para o castelo. Há por vezes sessões fotográficas no terraço.
No lado Este da cidade este é o único ponto alto onde se consegue observar a colina deste lado do castelo.” Além de ser um excelente ponto de observação, também é uma referência na paisagem de Alfama.
“Nós conseguimos ver melhor o edifício longe do que ao estar aqui. Por exemplo, se estivermos nas Portas do Sol (próximo do Castelo) temos a noção do volume deste edifício que é imponente nesta zona da cidade.”
Na verdade, das Portas do Sol o Mosteiro ganha uma relevância enorme pela sua dimensão e pela cor clara que sobressai no colorido do casario da colina de Alfama que espreita o castelo de Lisboa.
Há muitos anos. “O Mosteiro de S. Vicente de Fora existe desde o tempo de D. Afonso Henriques. É resultado de uma promessa do rei caso conseguisse conquistar a cidade de Lisboa aos mouros. Com o passar dos anos e apesar do mosteiro estar habitado, quase sempre pelos monges Regrantes de Santo Agostinho, foi ficando pouco a pouco arruinado. Ao chegar ao século XVI, com o início da terceira dinastia, D. Filipe I decidiu reconstruir o mosteiro. A ideia não era destruir o que foi mandado fazer por D. Afonso Henriques, mas sim uma forma de afirmar a sua legitimidade ao trono.”
Do mosteiro medieval sobra apenas uma cisterna onde podemos espreitar e continua a ter água.
Filipe II e Filipe III dão continuidade à reformulação do edifício. No entanto, com a Restauração, surgem novas alterações. Essencialmente na decoração. “É sobretudo de estilo barroco porque a quarta dinastia sentiu a necessidade de se apropriar deste mosteiro.
Tentaram apagar as marcas dos Filipes e dar um cunho próprio através de azulejos, pinturas, mármores embutidos…. Escolheram ainda o Mosteiro de S. Vicente de Fora para ser o panteão da quarta dinastia.”
Esta é uma das curiosidades do mosteiro. Desde a sua origem, em 1147, foi sempre utlizado como um instrumento do poder instituído.
A afirmação de um cunho propagandístico. Logo no seu início com D. Afonso Henriques a fazer emergir a marca cristã, após a conquista aos mouros. O marco seguinte é com os Filipes e depois com a Restauração. Pormenoriza Jona Santos que, “se formos à portaria do mosteiro e observarmos as histórias que aqueles azulejos contam, é isso que vamos encontrar. Vemos representados vários reis ligados à história do mosteiro exceto os Filipes.
Temos outros exemplos. D. Afonso Henriques com os monges Regrantes a estudar a planta do mosteiro e por detrás, já está o mosteiro a ser construído, mas não o medieval, é o que vemos hoje. A quarta dinastia, no fundo, o que queria dizer é que quem mandou fazer este mosteiro não foram os Filipes mas o primeiro rei de Portugal”.
Para reforçar a apropriação da quarta dinastia e a marca da nacionalidade, os Bragança fizeram do mosteiro o panteão da Casa Real.
Uma determinação que durou até à ultima família real. “Estão quase todos. Falta D. Pedro IV que em 1972 foi trasladado para o Brasil, a seu pedido, exceto o coração que ficou na igreja da Lapa, no Porto. Falta também D. Maria I que está na Basílica da Estrela que foi mandada construir por ela. Por fim, falta Maria Pia de Saboia que está em Itália.”
No século XIX, com o Liberalismo, há de novo uma alteração profunda, mandada realizar por D. Fernando II. O panteão mudou da igreja para o antigo refeitório do mosteiro porque, entretanto, os monges tinham saído com o fim das ordens religiosas. “
Tem mais a ver com uma questão de falta de espaço. Como estávamos num regime Liberal não era escandaloso termos túmulos em espaços não sagrados.
O que D. Fernando quis fazer foi também uma homenagem à sua adorada esposa. Quando D. Maria morre ele pretendia fazer um mausoléu do liberalismo onde homenageava a sua falecida esposa e o sogro, D. Pedro IV.
Houve uma série de projetos que por questões financeiras não foram concretizados. Foi por isso que se apropriaram de um monumento já existente, o Mosteiro de S. Vicente de Fora, e fizeram dele o tal mausoléu do liberalismo. É por isso, que ao centro estavam os túmulos de D. Maria II e D. Pedro IV. Hoje, se formos ao panteão vemos na antecâmara os túmulos do Duque de Saldanha, Duque e Duquesa de Terceira, heróis do Liberalismo.”
Com a implantação da República o panteão foi encerrado. “A entrada foi apenas facultada em 1932. Salazar decidiu fazer uma reformulação que esteve a cargo de Raúl Lino, conceituado arquiteto na altura. É ele que dá o aspeto que vemos hoje nos túmulos dos Bragança. Esse trabalho foi inaugurado em 1933. Foi Raúl Lino que desenhou os túmulos.” O que havia antes desta intervenção era uma sala grande com caixões acumulados, tendo ao centro D. Maria II e D. Pedro IV. De resto, era uma bancada com caixões uns em cima dos outros.”
Com a intervenção feita por Raul Lino o panteão deixou este ambiente assustador. Os túmulos em mármore têm inscrições em letra dourada e os monarcas distinguem-se de imediato com as coroas no topo.
Todos estes elementos dão alguma dignidade ao antigo refeitório, mas não tem a pompa, muito menos uma linguagem eloquente dos reis e rainhas da maior dinastia portuguesa. Por outro lado, escasseia informação aos visitantes, muitos deles estrangeiros.
“Primeiro ficam um pouco assutados porque ao centro temos uma escultura de Francisco dos Santos, representa a dor. É uma mulher com as mãos a tapar a cara. Depois, é uma sala com pedra branca, virada a Este, com um aspeto muito frio, duro, cru.”
Até o pretenso charme do ritual do chá atribuído à rainha de Inglaterra, Catarina de Bragança, passa de todo despercebido. É um tumulo que não se diferencia dos restantes.
“Antes de ela falecer disse que queria ir par junto do seu irmão D. Afonso VI que, na altura, estava sepultado nos Jerónimos. Mais tarde, é D. João V que manda trasladar D. Afonso VI e D. Catarina de Bragança para o Mosteiro de S. Vicente de Fora. Não é destacada.
Aliás, neste panteão, após a reformulação de Raúl Lino, os destaques vão para o primeiro rei da quarta dinastia, D. João IV, e para a última família real. De resto, têm todos a mesma aparência, muito minimalista.”
No mosteiro está também o Panteão dos Patriarcas de Lisboa. O mosteiro tem ainda o museu do Patriarcado com um conjunto vasto de património onde sobressai a relação da Igreja com a cidade de Lisboa.
Um outro património muito interessante é a coleção de azulejos considerada uma das mais belas do Mundo. “Temos azulejos de vários períodos. Os mais antigos são de 1690 que correspondem ao reinado de D. Pedro II. A maioria são do reinado de D. João V. Temos azulejos do período dos grandes mestres.”
Um dos destaque é a coleção das Fábulas de La Fontaine. “É uma história curiosa. No final do século XVIII os dois claustros do mosteiro foram fechados. As arcadas foram tapadas com muros e para a parte interior foram encomendados painéis de azulejos. Nessa altura decidiram trazer as Fábulas de La Fontaine. Hoje, se formos aos claustros e observarmos os azulejos não vemos um único com uma cena religiosa, porque o claustro foi considerado um espaço exterior. O mesmo sucede com as fábulas La Fontaine que não tem cenas religiosas. Transmitem uma moral através de personagens que são animais e essa moral não vai contra o que se diz no Evangelho. Acho que as fábulas La Fontaine foi uma forma de conseguirmos ter um programa profano e que não colide com o Evangelho.”
A descoberta dos azulejos leva-nos dos claustros a longos corredores que servem de antecâmera à nossa imaginação sobre a vida dos monges neste edifício simbólico para Lisboa. Os Cónegos Regrantes de Santo Agostinho estiveram aqui durante mais de 8 séculos. Até à extinção das ordens religiosas, uma decisão que teve forte impacto na rotina do mosteiro. “Desde a extinção das ordens religiosas até aos dias de hoje as ocupações do mosteiro foram muito variadas. Chegou a ser Casa Patriarcal, o primeiro Liceu Gil Vicente foi aqui, no século XX já foi IEFP, arquivo da Câmara Municipal, arquivo do Exército.
Está classificado como Monumento Nacional. Pertence ao Patriarcado, mas, como está classificado, qualquer intervenção tem de ser reportada à DGPC.”
A igreja destaca-se igualmente com as suas duas torres sineiras. Tem uma fachada monumental que ganha maior imponência com a escadaria em pedra, hoje muito útil para as fotografias de casamento com todos os convidados.
A singeleza e a geometria de linhas retas é incongruente com a graciosidade do arco na rua que permite o acesso ao Campo de Santa Clara onde tem lugar a Feirada Ladra.
oportunidade de verem um dos melhores órgãos de todo o Muno com mais de 3 mil tubos distribuídos por dois teclados.
Da enorme riqueza da igreja destaca-se o altar de estilo barroco da Capela-mor e um dos melhores órgãos de todo o mundo com mais de 3 mil tubos distribuídos por dois teclados.
Realizam-se visitas guiadas ao Mosteiro de S. Vicente de Fora. Pode obter mais informação aqui
Portugal dentro do Mosteiro de S. Vicente de Fora e no terraço um dos melhores miradouros de Lisboa faz parte do programa da Antena1 Vou Ali e Já Venho, e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.
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