Estamos numa pequena assoalhada da Casa Carlos de Oliveira. Entre livros e mobiliário que pertenceram a um dos mais notáveis escritores portugueses do século XX.

A máquina de escrever de Carlos de Oliveira
A máquina de escrever de Carlos de Oliveira

Quando nos sentamos em frente da velha máquina de escrever imaginamos partilhar o prazer da escrita. Também o relato de vivências, conforme escreveu o próprio Carlos de Oliveira “de uma aldeia pobríssima. Lagoas pantanosas, desolação, calcário, areia.”

Ana Mesquita, que recebe os visitantes na casa Carlos de Oliveira em Febres, no concelho de Cantanhede, salienta que esta realidade marcou o escritor.

A casa fica no largo principal de Febres
A casa fica no largo principal de Febres

Carlos de Oliveira teve, por exemplo, uma percepção mais próxima e dramática da mortalidade infantil porque o pai era médico municipal. Nas palavras do autor de O Aprendiz de Feiticeiro, “cresci cercado pela grande pobreza dos camponeses, por uma mortalidade infantil enorme, uma emigração espantosa. Natural portanto que tudo isso me tenha tocado (melhor, tatuado).”

Carlos de Oliveira retratado
Carlos de Oliveira retratado

Carlos de Oliveira nasceu em 1921 no Brasil, filho de portugueses. Regressaram a Portugal em 1923. Primeiro para Camarneira e de seguida para Febres. Para uma casa junto ao largo principal que recentemente foi adquirida pela Câmara Municipal.
Carlos de Oliveira veio para Febres com dois anos de idade e aqui viveu até concluir os estudos universitários em Coimbra. A casa foi restaurada mas mantém as diviões interiores originais.

Livros que estão numa pequena sala da Casa Carlos de Oliveira
Livros que estão numa pequena sala da Casa Carlos de Oliveira

Depois dos estudos de Coimbra e de publicar o seu primeiro romance, Casa na Duna, Carlos e Oliveira foi para Lisboa onde intensificou os contactos com o movimento neo-realista e nunca e nunca abandonou a sua ligação a Febres. Uma presença física e literária.
site_COliveira_DSCF8551Nas férias regressou com frequência à Gândara e na escrita, n’Uma Abelha na Chuva ou em Finisterra, descreve o quotidiano de uma vivência dura e passageira. “Casas construídas com adobos que duram sensivelmente o que dura a vida humana. Pinhais que os camponeses plantam na infância para derrubar pouco antes de morrer. A própria terra é passageira: dunas modeladas, desfeitas pelo vento”.

Hoje, devido a uma forte intervenção humana, a Gândara que se situa junto à orla marítima entre Vagos e Montemor-o-Velho. Já não é tão passageira. Febres é um exemplo. Refere Ana Mesquita que já não há tantos pântanos e são menos as lagoas.
Placa numa das ruas de TochaUma passagem pelas praias e dunas de Tocha e de Mira revelam ainda traços da cultura local e vestígios do património de meados do século passado como por exemplo a típica casa gandaresa. Tem duas portas e uma está reservada para o padre ou para o morto. Só a abriam nestas circunstancias.
Carlos de Oliveira morreu em 1981, com 59 anos de idade. A família ofereceu ao município de Cantanhede parte do espólio e também algum mobiliário e objectos pessoais.

Carta de Alexandre O'Neill a Carlos Oliveira
Carta de Alexandre O’Neill a Carlos Oliveira no Museu do Neo-Realismo

Um outro contacto e uma interessante redescoberta de Carlos de Oliveira pode ser feita no Museu de Neo-realismo de Vila Franca de Xira. O contexto ajuda a perceber a singularidade da obra de Carlos de Oliveira. Uma carta de Carlos Drummond de Andrade a Carlos de Oliveira a elogiar o valor da escrita do autor de Uma Abelha na Chuva é um bom testemunho da relevância literária que Carlos de Oliveira alcançou.

Ana Mesquita
Ana Mesquita

As dunas na Casa Carlos Oliveira faz parte do programa da Antena1, Vou Ali e Já Venho, e a emissão deste episódio pode ouvir aqui.

O Vou Ali e Já Venho tem o apoio:Af_Identidade_CMYK_AssoMutualistaAssinaturaBranco_Baixo

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